terça-feira, 22 de outubro de 2013

Uma boa história brasileira sobre poder, ambição e egoísmo

ARTIGO

A ambição e o egoísmo bem retratados em ‘Serra Pelada’

Por Djair Galvão*

A tendência humana de ceder à ambição e priorizar atitudes egoístas povoa o universo da literatura, do cinema e sempre se faz presente em outras manifestações artísticas.

Reafirmando esta tendência, o diretor de cinema Heitor Dhalia uniu-se ao ator Wagner Moura para dirigir e produzir o filme “Serra Pelada”, em cartaz em circuito nacional desde a última sexta-feira (19). A história resgata a epopéia da “corrida do ouro” brasileira ambientada no Pará na década de 1980 - numa área de onde saiu considerável parte da produção de ouro nacional e deu origem a uma cultura singular na região amazônica.

O roteiro é bem simples e direto: dois amigos deixam São Paulo em busca do ouro e se misturam a um universo de 20 mil garimpeiros oriundos de todos os cantos do país. A febre do ouro muda comportamentos, o que no dizer de um dos protagonistas do filme se resume à frase “este lugar piora as pessoas”. Misturam-se naquele lugar ambição, cobiça, sofrimento, poder, dominação e o resultado é o pior que se pode esperar.

A tentativa do governo militar de exercer algum “controle” sobre o garimpo criou uma nova “sociedade”: a 30 quilômetros do local, uma cidade foi erguida da noite para o dia. Lá, permitia-se tudo o que não era possível ter no garimpo – tais como homens, mulheres, bebidas, armas e toda sorte de desvios de comportamento que esta “mistura” produzia.

Após conseguirem o ouro tão desejado, os amigos da história de Heitor Dhalia e Wagner Moura entram em conflitos que só aumentam. A cobiça transforma a relação dos dois no mesmo ponto do qual falava o cantor Paulinho da Viola no clássico samba “Pecado capital” – “Quando o jeito é se virar, cada um trata de si/ Irmão desconhece irmão”.

Com ambientação perfeita, trilha sonora com lambadas, cabarés, bares e vilarejos que mais lembram paragens do Velho Oeste dos filmes americanos, “Serra Pelada” reproduz uma fase da recente história brasileira que precisa ser conhecida por todos nós. O filme pode deixar uma boa lição: a construção de uma nova sociedade passa, necessariamente, pela depuração dos seus erros, virtudes e costumes. Novos valores podem dar lugar ao que um dia foi uma montanha de erros, como no caso de Serra Pelada.

* Jornalista, professor e escritor, autor de O Saci de Duas Pernas (Eureca Produções, 3ª edição)

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Quem ensina, aprende!

Na passagem de mais um Dia do Professor, sempre vale a pena reforçar a mensagem simples que diz: "Quem ensina, aprende". Aprende com a experiência de quem compartilha conhecimento, com quem convive, com a família, com os livros, a internet, as ruas, os colegas, os vizinhos, as experiências dos mais antigos - enfim é um sempre um aprendizado.

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Artigo: Exposição em SP celebra a diversidade do mundo

Será que o mundo é como imaginamos?

Por Djair Galvão*

A mais recente exposição do premiado fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado tem méritos que superam a beleza plástica das imagens. “Genesis” reúne 245 fotografias dos quatro cantos do mundo com o propósito de ensinar algo simples e direto: o mundo não é, necessariamente, do jeito que imaginamos.

Quem mora nas grandes metrópoles é tentado a pensar o universo humano em conglomerados habitacionais, ruas e avenidas largas, cheias de carros, centros comerciais, prédios, casas, luzes, cores e muita gente circulando por todos os lugares. O nascer e o pôr do sol são ditados por esse ritmo.

Salgado prova que não é bem assim: uma família mora em uma casa no alto de uma árvore na África, um habitante do Ártico desliza suavemente em seu trenó puxado por renas – sem pegar congestionamento algum – e um caçador de aves em Papua-Nova Guiné exibe sua caça para as lentes do brasileiro sem se preocupar com o que pensam os defensores dos animais noutras partes do globo. Noutro momento, somos transportados para geleiras magníficas ou ficamos diante de iguanas gigantes de Galápagos, de jacarés do Pantanal e de leopardos do Quênia. Leões-Marinhos, indianos, habitantes da Sibéria, ariranhas, albatrozes e suas asas gigantes e a manada de elefantes enfeitam este cenário rico deste “outro mundo”.

É tanta beleza que parece não caber no olhar. A diversidade de rostos, lugares, tipos, ambientes inóspitos (para pessoas como nós) multiplica as possibilidades. Em dado momento você é tentado a pensar que tudo parece um filme. E não deixa de ser. É um conjunto de imagens, de gentes e de coisas, mas é a realidade. A realidade de boa parte dos bilhões de moradores do nosso planeta.

Em cartaz em São Paulo no Sesc Belenzinho, a exposição é uma aula foto a foto. Mostra que estamos pouco preparados para olhar para os outros. Olhar sem julgar. Sem querer que os outros sejam como gostaríamos ou como imaginamos. O que dizer dos índios do Xingu em seus trajes de cerimônia religiosa ou da mãe que carrega suas três crianças em um campo da Namíbia sem se preocupar com o que eu penso, faço ou deixo de pensar em São Paulo? Eles não sabem que eu existo, certamente nunca saberão e nem posaram para Salgado pensando nisso. Simplesmente se deixaram registrar porque confiaram no modo como ele os vê. Como eles realmente são.

O pai, a mãe, o professor ou a professora que quiser explicar aos pequenos (ou para os já crescidinhos) o que é diversidade, basta levá-los a estes universos eternizados nesta mostra. As imagens ensinam mais do que palavras, engolem qualquer discurso moralizador e encantam porque são reais. Lá não existem pessoas posando e nem lugares previamente preparados para as fotos. Mesmo que fosse assim, a mensagem não mudaria o principal: nosso olhar precisa ser “retreinado”. Nossas cabeças estão muito restritas a um cotidiano que nos aprisiona e nos torna tão pequenos diante de um mundo tão vasto e belo.

Esta é a moral desta fábula de imagens, de preto e branco, luzes e beleza: o mundo é tão diverso que não temos o direito de resumi-lo a uma visão mesquinha e pobre como a que construímos nesta nossa parte do mundo. Quem olhar detidamente as imagens captadas por Sebastião Salgado em “Genesis” vai pensar duas vezes antes de alimentar preconceitos tão idiotas quanto pensar que é o centro do universo.

* Jornalista, professor e escritor, autor de “O Saci de Duas Pernas” (Eureca Produções, 3ª edição)