segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Longa entrevista no jornal O Mossoroense

Reproduzo abaixo alguns trechos da entrevista que o jornal O Mossoroense, da cidade potiguar de Mossoró, publicou comigo na edição de domingo (25). A matéria saiu no caderno Universo e foi assinada pela jornalista Leilane Andrade.

DJAIR GALVÃO

Após 26 anos sem pisar em terras potiguares, o jornalista e professor Djair Galvão Freire voltou para lançar seu primeiro trabalho na área da educação infantil. Chegando numa quinta-feira nublada, mesmo perdendo a oportunidade de conhecer o famoso calor a 40° da cidade-natal, o escritor denotou curiosidade e verdadeira admiração com o crescimento de Mossoró.

À convite da Fundação José Augusto (FJA) e Secretaria de Estado da Educação e da Reforma Agrária, Djair Galvão realizou uma série de lançamentos da obra "O Saci de Duas Pernas" em cidades como São Paulo, Natal, Caicó, Caraúbas, Serra Negra do Norte, Campo Redondo, Apodi e Assu.

Numa demonstração de sensibilidade infanto-juvenil, o livro proporciona uma viagem ao universo das lendas e dos mitos revisitados a partir de uma contradição. O Saci de Djair Galvão nasce com duas pernas e sofre uma sorte de problemas por isso. Nesta conversa, que tivemos no dia do lançamento em Mossoró, o autor fala sobre sua experiência de vida e a difícil tarefa de ajudar à sociedade a viver num mundo melhor, com mais respeito àqueles que nos parecem ser diferentes.

POR LEILANE ANDRADE
leilaneandrade@gmail.com

O Mossoroense - Você é mossoroense de berço, mas mora em São Paulo atualmente. Quando foi embora?

Djair Galvão - Meu pai era militar, chamavam-no de Sargento Freire e ele percorreu diversas cidades do Rio Grande do Norte. De 1960 a 1966 ele foi subcomandante do Batalhão de Polícia de Mossoró. Eu nasci em 1964 aqui e com dois anos de idade nós precisamos nos mudar, ele foi transferido para Patu, onde assumiu a Delegacia de lá e ficamos até 1971. Por este motivo, eu tenho poucas lembranças daqui, eu me recordo mais de Patu, que foi onde eu me criei mesmo e passei boa parte de minha infância. Depois disso, nós fomos morar em Caicó, no Seridó, onde fiquei até 1986. Neste período foi quando tive meus primeiros contatos com o jornalismo, trabalhando na Rádio Rural. Foi uma coisa que me apaixonei e acabei enveredando por essa área. Para você ter uma ideia, em 1983 eu criei um jornal, "O Eco". Eu mesmo datilografava num mimeógrafo e fazia umas capas que deixava em aberto o local da edição, mês e ano, lembro muito bem, eu preenchia esses espaços a caneta. E eu mesmo fazia também a distribuição.

OM - De onde surgiu a influência de ingressar pela área literária?

DJ - Eu fui um leitor muito precoce de obras de Monteiro Lobato, clássicos da literatura, principalmente fábulas. Sempre fui muito apaixonado por essas histórias. Sou de uma família muito numerosa, tenho 12 irmãos e meu pai sempre gostou muito de leitura. Ele dizia pra gente que queria suprir algumas lacunas que ele teve na infância e pedia pra gente ler. Então, eu muito cedo despertei para esse lado. Além dele, tenho um irmão, que foi embora morar no Rio em 1978, e todos os anos ele vinha e trazia uma bolsa com 100 a 200 gibis, que ele dividia comigo e outro irmão nosso. Eu vivia nesse mundo. Interessante que eu nunca tive medo dos personagens de fábulas, eles sempre me atraíram pelas suas engenhosidades. Logo que aprendi a ler, não sei quantas horas por dia eu ficava no meu quarto lendo. O despertar foi mais ou menos por aí, mas minha formação como leitor tem outros elementos. Eu li muito cordel e sempre gostei da literatura de feira, do embolador de coco, do tocador de sanfona. Toda formação está impregnada dessas coisas bem rurais, apesar de eu ter morado sempre na cidade. Eu também quando adolescente, era muito curioso, eu gostava de ficar no meu quarto tentando sintonizar o rádio em emissoras de outros países, mesmo sem entender nada do que eles falavam, eu gostava de ficar escutando. Então, é todo um universo que às vezes os pais nem sabem que você tem e que você faz algumas elaborações mentais como "O que será que vou ser ou fazer".

OM - Quais suas atividades na época e agora?

DJ - Antes de ir embora, eu trabalhava na Rádio Tropical, como apresentador de um noticiário, e no jornal Dois Pontos (atual diário natalense Jornal de Hoje), com o professor Marcos Aurélio. Fui para São Paulo em 1989 e chegando lá comecei como colaborador de uma Agência de Notícias de um grupo ligado à questão progressista, um emprego que consegui através de um amigo de Caicó, hoje radicado em São Paulo, o Demir Azevedo, uma figura extraordinária. Com esta atividade, eu tive a oportunidade de entrar em contato com pessoas muito boas, de um time muito envolvido com questões sociais e direitos humanos. Depois passei a trabalhar com Assessoria de Imprensa, começando com o Hospital das Clínicas, que é uma verdadeira cidade com 10 mil funcionários. Hoje, continuo com assessoria e tenho um cargo licenciado na Prefeitura de São Paulo como professor efetivo da rede municipal.

OM - Por que escolher o personagem folclórico Saci?

DJ - A escolha do Saci foi um modo de provocar uma discussão. Quem passou pela obra de Monteiro Lobato, não tem como esquecer do Saci. Esse personagem ficou largamente difundido no Sítio do Pica-Pau Amarelo, mas ele é muito mais antigo do que se pensa. Um personagem lendário e mítico, que já existia entre os índios brasileiros, antes mesmo da colonização do Brasil. Ele tinha duas pernas, um rabo, a cor da pele era aproximada ao do índio e sua característica era ajudar as pessoas perdidas nas florestas. Com a colonização, acontece uma mistura de culturas que acabam modificando o Saci e forjou vários outros personagens. Nesse processo, dos europeus ele ganhou um gorro, dos índios e africanos ganha o cachimbo e a cor da pele negra. E vem essa questão da perna que há muitas controvérsias e existem muitas histórias que explicar. Uma delas conta que o Saci teria perdido a perna em lutas de capoeira e outra diz que ele era um ser libertário. E para se livrar dos grilões, teria preferido cortar a perna a estar preso. Com isso, ele teria ganhado poderes sobrenaturais e com a capacidade de aparecer de repente, em redemoinhos e de afugentar as pessoas que provocavam problemas à sociedade.

OM - Qual a temática do livro?

DJ - Com o livro, eu proponho às crianças discutirem a dificuldade que temos de respeitar aqueles ou aquelas situações que consideramos diferentes. Existe hoje uma discussão muito grande em ciclos acadêmicos e no governo em torno das palavras da moda como "diferença", "inclusão", "diversidade" e criam programas de inclusão de toda ordem que se possa imaginar. Na verdade, eu sempre fui muito cético com o conceito de diferença, porque se todos nós somos, em tese, diferentes, então não existe a diferença. Se ninguém é igual a ninguém, onde está a diferença? Na prática, não existe diferença entre os seres se usar os preceitos filosóficos. Mas como existe o conceito, a ideia é que deve-se trabalhar com ele. Então, as crianças precisam saber que há necessidade de entender as pessoas não por aquilo que elas consideram diferentes e sim pelas virtudes. É preciso primeiro conhecer a pessoa, independente do que ela apresenta por fora. Então, o Saci, por ter nascido com duas pernas, ele tem muita dificuldade de conviver com os outros, pois é mais ágil, mais hábil por ter duas pernas. E isso causa um sério problema nessa floresta, nessa sociedade da fábula que eu imaginei. A mensagem que deixo é: procure no seu amigo, colega ou pessoa de convivência, estimulando seu filho a ver nos outros suas virtudes, saber o que elas têm a dizer. Geralmente, vemos aquelas pessoas que conseguiram destaque na sociedade, mesmo com deficiências, como alguém que superou desafios. Mas, só porque aquele coleguinha de classe é portador de alguma deficiência, mas não é o Steve Wonder ou o Ray Charles, não significa que devo desrespeitá-lo ou discriminá-lo.

OM - Você pensa em prosseguir com a literatura infantil, publicando novas obras?

DJ - Sim, já tenho um novo trabalho em andamento, que está pronto mentalmente. Ele também é voltado para questões educacionais, pois historicamente há uma carência muito grande de escritores novos no mercado da literatura infantil. Hoje, estou iniciando a carreira e tenho tido a sorte de ser muito bem recepcionado onde chego para lançar o livro e almejo alcançar destaque em nível nacional.


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