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Dois episódios ocorridos em São Paulo chamam a atenção do país pelas contradições, polêmicas e por conta das pessoas envolvidas. No primeiro, um delegado foi acusado de agredir um cadeirante ao ser questionado por ocupar uma vaga destinada a deficientes. No segundo, um vídeo que se espalhou dia desses na internet, dá conta de uma ação da Corregedoria da Polícia Civil paulista na qual uma escrivã acusada de corrupção é despida à força por policiais.
No primeiro caso, o delegado acusado da agressão disse que "apenas deu uns tapas" no cadeirante depois de sofrer algum tipo de agressão verbal. No outro, o delegado da corregedoria despiu a investigadora acusada para encontrar a prova que buscava - dinheiro ilícito que esta teria escondido em peça íntima.
Duas autoridades em situações distintas, mas que remetem a uma reflexão: até onde vai o poder de quem representa a lei? A legislação a esse respeito é clara, sabemos disso - e ambos certamente sabiam muito bem, mesmo quando foram além dos limites impostos pela lei. Ambos conflitos provocaram muita discussão nos últimos dias.
Houve quem defendesse a ação truculenta contra a investigadora, uma vez que a situação dela seria insustentável: como pode uma policial compactuar com o crime? Portanto, seria justo que, "ao mudar de lado", ela deveria receber o mesmo tratamento de uma criminosa comum - se bem que isso renderia outro debate mais profundo ainda.
Esses dois conflitos lembram uma velha máxima popular: um crime (ou um suposto crime, melhorando o ditado) não justifica o outro. Um erro não deve ser encoberto por outro. Ao ocupar a vaga do cadeirante o delegado já cometeu uma infração, que não poderia ser acobertada pela reclamação - ainda que por um impropério - deste. E nem faz sentido uma pessoa ser investigada sem que se respeitem direitos básicos de imagem e de intimidade.
A complexidade dos casos só demonstra o quanto ainda precisamos avançar no entendimento do que são "direitos humanos" - algo que vai muito além dos presídios, dos presos, mortos e feridos que movem o debate mais comum acerca deste tema na sociedade.
Todavia, esses casos já revelam a grossa camada histórica brasileira que encobre a tradicional frase atribuída a "autoridades" sempre que estas são questionadas ou querem provar que estão acima de alguém: "Você sabe com quem está falando?".